Por que a utilização do Relatório Final
do Cenipa
é Fundamental nos processos judiciais?
é Fundamental nos processos judiciais?
Por: Sergio
Roberto Alonso, advogado especialista em Direito Aeronáutico, e
Rita De Cássia B.L.Vivas, advogada especialista em Direito Processual Civil
Rita De Cássia B.L.Vivas, advogada especialista em Direito Processual Civil
A
Lei nº 12.970, de 08 de maio de 2014, proíbe
expressamente em seus artigos 88 - H e
88 - I § 2º, a utilização do Relatório Final editado pelo Centro de
Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), em processos
judiciais decorrentes de acidentes aeronáuticos.
Esta
proibição é inconstitucional, e viola o art.
5º, incisos XXXV e LV da Constituição Federal, pois na prática restringe o
acesso das partes ao Judiciário, além de violar o princípio constitucional da
ampla defesa.
Diante
da alta complexidade da aviação e dos acidentes aeronáuticos, onde vários
fatores estão envolvidos (erro humano, violação de normas, infraestrutura
aeronáutica, erro de projeto, defeito de construção, etc.), somente um laudo
feito por especialistas e com a qualidade técnica dos elaborados pelo Cenipa (observe-se
a excelência dos relatórios finais do Acidente da GOL-907 e da TAM-354) poderão
constituir prova suficiente para que as partes demonstrem a ocorrência de dolo ou culpa grave como causa do sinistro, assim
possibilitando as mesmas pleitearem indenizações ilimitadas.
A lei
em comento, além de inconstitucional, é uma quimera jurídica, pois proíbe a
utilização do laudo feito por expert e com excelência, ignorando a diversidade
e desigualdade dos 27 Estados da Federação e mais de 5000 municípios ao remeter
à policia civil, que não dispõe na maioria das vezes de meios sequer para
realização de uma perícia de trânsito, a realização de uma perícia de acidente
aéreo, onde toda a documentação, estudos e análises só são possíveis se feitos por
quem entende de aviação e de aviões.
O
Relatório Final do Cenipa disseca e mapeia as causas do acidente, como uma
tomografia computadorizada, e sua proibição nas causas judiciais, equivale
proibir o juiz de utilizar-se do laudo necroscópico, para determinar a causa mortis, determinando que o faça
através de um laudo elaborado por um auxiliar de enfermagem.
Esta
lei também contraria o princípio do livre convencimento do juiz, pois este não
poderá utilizar-se do laudo para proferir a sentença, embora sabido que a
função da prova pericial é tão somente a de emprestar ao processo relato
técnico relevante.
Ademais,
a Lei Processual Civil já determina, com veemência, que o juiz analisará
livremente a prova de acordo com os elementos dos autos - art. 436 do Código de Processo Civil. Desse modo, a utilização
do Relatório do Cenipa nas causas de acidente aéreo, visa apenas conferir ao
juízo análise que o permita valorar o resultado da perícia. Nada mais!
O
uso o Relatório do Cenipa não representa intromissão na hermenêutica dos autos,
até mesmo porque ao perito não é dado imiscuir-se em questões jurídicas,
estando limitado à análise técnica.
Esta
lei é um retrocesso no nosso sistema jurídico, e na evolução do Direito Aeronáutico
e, ainda, contraria a iterativa e pacífica jurisprudência dos nossos tribunais.
Todas
as decisões que modernizaram o direito aeronáutico, em favor dos usuários do
transporte aéreo, utilizaram-se do Relatório Final para comprovar a culpa grave
das empresas aéreas, condenando-as ao pagamento de indenizações ilimitadas as
vítimas e/ou parentes de acidentes aeronáuticos.
Entre
outras são emblemáticas as decisões proferidas nos processos de Maria Cocato X VASP,
ainda sob a égide do Código Brasileiro do Ar de 1966, no qual a 7ª Câmara do Primeiro
Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, utilizando-se do Relatório Final editado
pelo Cenipa, equiparou a Culpa Grave ao Dolo para determinar o pagamento de
indenização ilimitada, de acordo com a lei civil para a mãe da vítima (acidente
ocorrido no Ceará - Serra de Pacatuba em 1982). O outro processo é o de Amizue
Bezerra da Motta contra a Varig, que em sede de Recurso Especial firmou tese de
que ocorrido o acidente aéreo no exterior, não flui o lapso prescricional
enquanto se apuram as causas do acidente, de cujo conhecimento pelos
interessados depende o ajuizamento da ação (acidente ocorrido em 1987 na Costa
do Marfim). Isso, por si só, demonstra a relevância da utilização do Relatório
Final do Cenipa em juízo.
O
Egrégio Supremo Tribunal Federal em um de seus julgados firmou a tese de que, o
Relatório Final do Cenipa equipara-se às decisões do Tribunal Marítimo, para
estabelecer as causas de acidente aeronáutico, tendo a presunção de verdade.
Portanto,
a lei supra referida além de ser inconstitucional, feriu corações e mentes de
parentes de vítimas de acidente aéreo, que normalmente sofrem de impacto tardio
em sua saúde mental (tese de Doutorado da Dr.ª Maria da Conceição Pereira
Sougey, psicóloga especializada em aviação e pertencente aos quadros do Cenipa),
e que com esta lei terão dificuldades de obter resposta à pergunta que as
angustia, por que deixaram que isso pudesse acontecer?
Por que o Conselho Federal da OAB Ou o próprio MPF ainda não ingressaram com ADIN para que seja declarada a inconstitucionalidade dessa vedação legal?
ResponderExcluirO MPF já entrou com essa ADIN, é a nº 5.667 e a ABRAVAGEX (www.abravagex.org.br) foi aceita pelo MPF e pelo STF como amicus curiae.
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ResponderExcluirOla, André! Obrigado por acessar o meu blog. Essa é uma boa pergunta e, na minha opiniao, seria o caso deles ingressarem, como uma forma objetiva e concreta de proteger a sociedade e os usuarios da aviação.
ResponderExcluirDr. Sérgio Alonso, bom dia!
ResponderExcluirSou acadêmico do curso de Direito, ex-militar da Força Aérea Brasileira, gostaria de manter contato com V.Exa., pessoa ilustre e de notável saber jurídico no âmbito do Direito Aeroespacial, se possível, favor confirmar meios de contato. Diante desta matéria rica e da objetiva e ampla explanação, resta claro o Vosso conhecimento raro no ramo em tela. Parabéns!